O que começou como um protesto contra privilégios parlamentares se transformou em uma onda de violência que resultou em prédios incendiados, mortes e a maior crise política desde a queda de Suharto, em 1998.
O estopim: 25 de agosto de 2025
Na segunda-feira, 25 de agosto, milhares de estudantes e trabalhadores tomaram as ruas de Jacarta. O alvo era claro: o subsídio de 50 milhões de rúpias mensais destinado a parlamentares como auxílio-moradia — valor quase dez vezes superior ao salário mínimo do país. Em um cenário de desigualdade social gritante, a medida foi vista como um insulto à população. A repressão policial, com gás lacrimogêneo e canhões d’água, só acirrou os ânimos.
O choque fatal: 28 de agosto
Três dias depois, em 28 de agosto, o mototaxista Affan Kurniawan foi atropelado e morto por um veículo policial durante uma manifestação na capital. Imagens do incidente se espalharam pelas redes sociais, transformando o caso em símbolo da violência do Estado contra os mais pobres. A morte de Kurniawan foi o ponto de virada: a indignação virou revolta.
Fogo nos parlamentos: 30 de agosto
No sábado, 30 de agosto, a revolta explodiu. Em Makassar, capital de Sulawesi do Sul, manifestantes invadiram e incendiaram o prédio do parlamento regional (DPRD). O fogo deixou três mortos e cinco feridos. No mesmo dia, episódios semelhantes se repetiram em Mataram, Pekalongan e Cirebon, onde edifícios legislativos também foram tomados pelas chamas. No total, 37 prédios públicos foram atacados em 19 províncias, entre eles delegacias e estações de transporte.
A resposta do governo: 31 de agosto
Diante do caos, o presidente Prabowo Subianto falou à nação em 31 de agosto. Tentando conter a crise, anunciou a revogação imediata do subsídio de moradia e suspendeu as viagens oficiais dos parlamentares. Ao mesmo tempo, endureceu o discurso contra os manifestantes, chamando-os de “desordeiros” e autorizando o uso do Exército para reforçar a repressão em Jacarta e outras capitais regionais.
Escalada da violência: 1º a 3 de setembro
Mesmo após as medidas, os protestos se intensificaram. Entre 1º e 3 de setembro, ruas de cidades como Yogyakarta, Surabaya, Palembang e Banjarmasin foram tomadas por confrontos. Movimentos sociais denunciaram abusos policiais e o uso desproporcional da força militar. O saldo oficial já apontava ao menos dez mortos, centenas de feridos e milhares de detidos.
Os danos materiais, estimados em 900 bilhões de rúpias (53 milhões de dólares), são expressivos. Mas o maior prejuízo é político: a crise expôs, com brutalidade, o fosso entre representantes e representados. O parlamento, antes símbolo de debate e construção democrática, transformou-se em alvo da fúria popular.
A Indonésia mostra ao mundo uma realidade incômoda: quando privilégios e distâncias sociais se tornam insuportáveis, nem os palácios da política estão a salvo das chamas da indignação.
A crise evidencia o descompasso entre a classe política e a população. A revogação dos subsídios pelo presidente foi tardia e insuficiente diante da indignação acumulada. Ao mesmo tempo, a militarização das ruas expõe o risco de autoritarismo emergente, mesmo em uma democracia consolidada.
O episódio deixa claro: privilegios absurdos e repressão estatal são catalisadores de revolta social. Os incêndios nos parlamentos e prédios públicos refletem não apenas violência, mas um grito por representatividade justiça social e respeito ao cidadão.